domingo, 16 de fevereiro de 2020

Murder on the Malta Express, By John Sweeney, Carlo Bonni e Manuel Delia

As memórias do Churchill da segunda guerra mundial foi provavelmente a coisa mais fascinante que já li na minha vida. Adoro a segunda guerra mundial, (salvo seja!), mas o que eu gosto mesmo é daquele espírito inglês, que o Churchill personifica melhor que ninguém e que se resume mais ou menos assim: We will fight you in the sky, in the sea, in land, even in fucking hell if we need to, BUT WE SHALL NEVER (EVEEERR) SURRENDER, YOU SYCHO SUN OF A NAZI BITCH!

O que eu adoro isto!

E por que é que estou a falar disto? Porque foi este mesmo espírito que encontrei aqui neste livro sobre a vida e obra da Daphne Caruana Galizia. Neste caso não é nazismo, é mais fascismo, mas não menos virulento. Joseph Muscat, o "sycho sun of a fascist bitch" desta história, conseguiu virar um país inteiro - ainda que seja o mais pequeno país da União Europeia e se calhar por isso foi tão fácil - contra a sua melhor jornalista. Foi perseguida pelas ruas, atearam-lhe fogo à casa, envenenaram-lhe os cães, mataram-na com uma bomba no carro e até há bem pouco tempo destruíam todos os dias - e às vezes mais do que uma vez ao dia - o memorial de protesto a pedir justiça pelo seu assassinato e pelos crimes que investigou e divulgou. Fascismo do pior!



Mas tal como o Churchill, nem por um momento baixou a cabeça e devo dizer, que quanto mais furiosa se torna a sua luta contra a mafia corrupta que governa Malta, mais hilariante se torna a sua escrita. Um exemplo é esta resposta aos trapaceiros da Henley and Partners, que têm por core business, vender passaportes a trafulhas com dinheiro, que "queimaram" o passaporte original:

"No wonder Henley and Partners has broken out into a cold sweat. Regardless of their claims to the contrary, Malta is their only Eu-passports-like-pastizzi money-tap. And the Maltese government is the only EU member state government with which they have a contract - and not just a contract but crooks at the wheel, including the Prime Minister's chief of staff. Note to Henley and Partners: if you send me another cease-and-desist letter with a warning not to publish it, I'm going to publish it, then print it and use it when I next take the dog for a walk. If I'm angry enough, I might then even post it back to you."  

Esta é a Daphne Caruana Galizia que mais admiro, a jornalista que era capaz de criar seis problemas impossíveis de resolver, aos todos poderosos de Malta, antes sequer de tomar o pequeno-almoço. E a melhor montra deste seu ímpar talento é o seu blog, "Running Commentary", cuja leitura também recomendo vivamente. 
A minha personagem favorita é de longe a primeira-dama, sua alteza real (not!), Michelle Muscat, que é assim uma mistura de Evita Peron, com palhaço rico e cara de shar-pei. Na minha humilde opinião, talvez o livro peque por não fazer jus à enormidade que é a falta de noção do ridículo (e de gosto) desta senhora. Mas o blog faz. Inteira justiça. Desde, "Time for a positive post: Mittelkless highlights from Mrs Muscat's Queen of Fashion Scrapbook", até ao meu favorito, "Princess Leya is dead-but never mind, because Mrs. Muscat is dressed as a Jedi", se não tivesse visto as fotos com os meus próprios olhos, não acreditava. Mas admito que isto se calhar não é assim tão interessante e muito menos importante, só é muito divertido. 

Muito tenho lido, nos mais variados jornais e revistas, sobre a personalidade desta fascinante personalidade, mas, por mais invulgar que isto possa parecer, quem melhor descreve esta incrível jornalista é mesmo a própria, num post datado de 30 de Junho de 2017, nem 4 meses antes da sua execução à bomba:

«It’s an extremely difficult situation, but 30 years of trying to bulldoze me into the tarmac haven’t worked for no reason other than my character traits. It is the nature of my personality to think in terms of “Do your worst, you bastards, until the only option left to you is to take out a contract on my life. Let’s see where your obsession takes you.” But this is not learned. You are either that way, or you are not. And living like that shapes your life in a way that few people can handle, which I understand completely.»

É digno de Churchill ou não é? Posso apostar que aquela sua famosa frase, sobre os livros serem os meios, através dos quais, a humanidade será triunfalmente catapultada para o futuro, era mesmo acerca de livros como este. 
E sem vos querer estragar o final, também não resisto a adiantar que é um grande final. Não sei por quê criei esta fraca expetativa de que o final deste livro em particular, só podia ser uma desilusão e tanto que me enganei. Acaba bem ao estilo Churchilliano de "We Shall Overcome!" Acabei o livro lavada em lágrimas.   


Havia de haver mais pessoas assim… Até os guardei juntos na estante para fazerem companhia um ao outro.  A propósito, será isto, o que o Boris Johnson chama "The Churchill Factor"? Não deve ser…


A pior parte de ter lido estes dois livros assim, um a seguir ao outro, é que ao fim de dois anos a lutar ferozmente contra o fascismo - sim, demorei dois anos a ler o nobel do Churchill, que isto é um calhamaço! Não dá propriamente para enfiar no bolso e lê-lo em todos os pequenos tempos livres - estou a ler (e a apanhar a seca da minha vida!), com o "Revolucionary Road" do Richard Yates. Recheado de personagens, que a única coisa que combatem, é a imensa pasmaceira das suas vidas sem sentido. E mesmo assim, só duas personagens é que ainda lutam mesmo. As outras parecem-me irremediavelmente rendidas ao fatal tédio e à enorme frustração que as rodeia. Como é que me concentro nisto?  Os meus neurónios já ameaçam desmaiar de cada vez que lhe vou a pegar…